Complexo: Universo Paralelo

Nas entranhas do Alemão

A visão “de fora” em Complexo: Universo Paralelo é apenas relativa, já que seu diretor, o português Mário Patrocínio, vive e trabalha no Brasil desde 2004. Realizou o filme em 2007, em parceria com o irmão cinegrafista Pedro Patrocínio. Não é um olhar de turista nem de agente social, mas de um documentarista disposto a compreender a fundo o seu objeto.

De qualquer forma, não deixa de ser um filme de estrangeiro – e isto se manifesta favorável e desfavoravelmente. Não me lembro de um doc brasileiro que tenha penetrado desta maneira nas entranhas do Complexo do Alemão, revelando suas facetas de rocinha interiorana, terrenos baldios, vazadouros de lixo, veredas e pontos de fuga. Ou que tenha revelado a topografia do lugar com tal riqueza de detalhes. Trunfo do filme é também o personagem do Sr. Zé, um imigrante nordestino que há 30 anos preside a associação de moradores com dedicação de síndico amoroso e conhece a história da favela desde seus primórdios, quando ela não passava de pouco mais de 100 cabanas abrigando conterrâneos velhos de guerra. Por sua vez, Dona Célia, mãe de família que já passou por poucas e boas, exemplifica o tanto de resiliência, alienação e esperança que tempera muitas vidas nas periferias urbanas brasileiras.    

Do lado desfavorável temos uma abordagem superficial da cultura e da sociologia da favela através de MC Playboy e uma extensa audição de bandidos com seus típicos discursos de queixa mesclada a desafio e bons propósitos. Fruto do desejo de ouvir todos os protagonistas, esse material pode ser revelador para um público externo, mas traz pouca novidade para quem vem tendo um contato razoável com os docs brasileiros sobre o tema.

Visualmente, o filme é quase sempre interessante. Algumas sequências tangenciam o estilo de Werner Herzog pela potência do quadro, embora a edição clipada o aproxime também do modelão Favela Movie. Entre ganhos e perdas, o saldo é positivo como retrato das contradições de uma comunidade. 

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